quinta-feira, 17 de maio de 2012

Relatos da introspecção

- Eu não quero! - Disse a Razão.
- Mentirosa, quer sim. Eu sei. - Disse a Emoção.
- Eu estou amando, mas prevejo que vão me trucidar. - Disse o Coração.
- Vou me machucar, vou me machucar, vou me machucar! - Disse o Sistema Nervoso.
- Posso participar da conversa? - Questionou o Cérebro.
- Sim! - Em coro, todos responderam.
- Então, eu concordo com a Emoção, senhorita Razão.
Também concordo com o Sistema Nervoso. - Disse o Cérebro.
- Por que você tem esse ar, tão... tão dono da verdade? - Perguntou o Coração.
- Cala a boca. Você não sabe de nada. - Respondeu a Razão.
- Não dá pra dialogar com vocês, ninguém tem neurônios. Só eu mesmo. - Disse o Cérebro, saindo da conversa.
- Na verdade eu não amo não, por isso não vou me machucar. Sistema Nervoso, acho melhor nos retirarmos da conversa também. - Disse o Coração.
- Não vão não. - Disse a Emoção.
- O que a gente faz? - Indagou o Coração.
- Vamos arrumar uma solução. - Disse a Razão.
- Vocês todos estão errados! - Gritou a Mentira chegando na conversa.
- Escutei meu nome de longe... Aqui não tem espaço pra você, Mentira. - Retrucou a Verdade, chegando do lado oposto.
- Chega. Chega. Vamos parar com isso. Eu já sei o que fazer e não preciso de nenhum
de vocês comigo, exceto o Coração. Portanto, podem se retirar. - Disse a Razão.

Após muitos borburinhos, o pedido da Razão foi aceito.
- Coração, acho que essa sua amizade com a Emoção vai de mal a pior. Vai por mim. - Disse a Razão.
- Se eu me separar da Emoção, minha vida perde o sentido. - Disse o Coração.
- Não perde não, eu existo. - Disse a Razão.
- Vamos nos unir? - Sugeriu a Razão.
- E se não der certo e eu me machucar? - Respondeu o Coração, cabisbaixo.
- Vai dar certo. Somos a parceria que todos queriam ter. Juntos vamos nos equilibrar e poder viver de forma mais feliz. - Disse a Razão.
- Podemos formar um trio imbatível. - Sussurrou a Verdade se aproximando.
- Só preciso do seu aval. - Disse a Razão para o Coração.

sábado, 12 de maio de 2012

O medo, a perda

Perdi as estribeiras do poder.
Sentei-me à beira mar para observar além do horizonte.
Além da linha que divide o céu do mar.
Quando eu achava que as ondas tinham desaparecido, lá estavam elas: voltando, indo e voltando novamente.
Em pouco tempo um céu acinzentado encobria o azul que tanto me atraía.
Nuvens carregadas chegavam, perfeitamente armadas para despejar um céu de gotas. Perdi o direito de ficar ali contemplando o que minha mente via através do meu olhar.

Já ensopado, abri a porta, joguei a chave na mesa e me atirei no sofá.
- Pluft! Plaft! - Arremassava meu tênis.
Brincando de fazer contas, só hoje eu perdi o ônibus para o trabalho, o horário de visitas no hospital onde minha única avó está, o ingresso (já esgotado) do último dia da peça que encerra a temporada, o celular, o azul do céu e o horizonte.

Posso contar nos dedos. Mas se for contar a partir de semanas, meses, vou precisar de um diário de perdas.
Não me dou bem com elas. E elas, muito menos comigo.
Perder um ônibus pode ser perder uma oportunidade qualquer, das boas às parcialmente boas. O horário de visitas podia ser o último com a minha avó viva. O último dia de peça podia me reservar algo. O celular... Podia ter sido alguém precisando de mim. O azul do céu poderia ser o ganho da consciência limpa, tranquila e calma. E o horizonte, o plano paralelo ao infinito, ao ser, ao estar, ao sonhar em proporções extensas.

Mas eu os perdi. Perdi a paciêcia com o ônibus e com a recepcionista que me impediu de visitar a Dona Lourdes. Perdi minha carteira quando a joguei pela janela depois de perceber que meu ingresso não estava lá. Não imaginava que perderia meu celular ao sair de casa, em menos de 5 minutos, para procurar a carteira. Prefiro perder a chance de dar continuidade ao resto...

Eu sou um perdedor daqueles típicos.
A minha vida é perder, inclusive, já nasci perdendo a vida e, meu relógio tem bons ponteiros que marcam minha sentença a cada tic-e-tac.
É só perder e perder e perder.
Quando é que vou perder o poder de perder?

Mas tá tudo bem. Nem tão bem assim.
Mesmo perdendo a cada instante, uma coisa não se afasta de mim. Eu não a deixo escapar. Não, eu não posso.
Me baseio no ditado "se não pode contra ele, junte-se a ele".
Não perco a esperança de um dia perder o medo de perder.