quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

II. Uma boca que cala

Mais uma da série.

II. Uma boca que cala

Você pode ficar com as suas verdades e os seus achismos,
Com sua falsa ingenuidade e com seu temperamento sombrio.
De tenebroso já me basta seu gesto prepotente, seu conjunto de reações autoritárias.
Já cansei de ser seu jeans desbotado, seu botão reabotoado, seu pedaço de pano remendado.
Minha vida já está gasta, e você parece gostar do tanto que me desgasta.
Eu pareço não me dar conta do quanto tenho sido um sapato velho para um pé descalço.
Ao emudecer minhas palavras, me proponho a apenas pensar.
Defronte a seus olhos, me submeto a calar pensamentos prestes a saltar da boca,
Que, tão seca se inibe e engole frases feitas.
Feitas para que não mais me cale, feitas para que eu não me abale.
De inibições e recusas continuo submetendo meus devaneios.
Meus ouvidos surrados de seus esfaqueios apenas ouvem.
Sua boca fala e seu corpo gesticula em tamanha proporção.
Meu coração aperta e meus olhos se voltam para o chão.
Entre tantas outras, uma boca que cala.
Cala-me, calo-me.
Entre tantos calares indefesos,
Um olhar disperso, um amor saturado e uma vida morna.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

I. Uma boca que fala

>Gente, vou começar uma série de textos com o mesmo propósito e basicamente o mesmo tema. Vou dividir em algumas partes, que serão postadas sequencialmente. Essa é a primeira. Vem mais por aí. Espero que curtam essa "novidade".<


I. Uma boca que fala


 -... porque, meu anjo, olha, olha ao nosso redor, esse verde, esse parque, essas pessoas, esse ar puro. – Ela suspira bem fundo – Esse cheiro campestre maravilhoso, nem parece cidade grande, isso é uma maravilha, você é uma maravilha. Eu não consigo me imaginar com outra pessoa, eu...
- Joana...
-... estou completamente apaixonada por você. Olha o seu rosto, os seus olhos lindos, a sua forma de se vestir, o seu cabelo liso todo bagunçado por causa do vento, e esse nariz de paçoquinha que sempre me dá vontade de morder... ah, e...
- Joana, me escuta...
-... essa boca linda, linda, linda, de beijos deliciosos. Essa boca que tanto me deu prazer, que tanto disse que me amava, que tanto sussurrou lindos trechos de música, esses lábios quentes, sedutores, doces, másculos. Eu sou cinquenta por cento apaixonada pela sua boca que só me ama e me ama e, me ama... desculpa a minha tagarelice, é que eu te amo tanto, esse dia tá tão lindo e agradável. Pode falar agora, meu amor.
- Acho melhor você se levantar do meu colo, sentar à minha frente e olhar nos meus olhos.
- Ah, daqui tá bom... minha cabeça recostada na sua perna que é um ótimo travesseiro. Dá pra ver seu tórax, seu queixo, sua boca, seu narizinho, quer dizer, meu narizinho de paçoca e seus olhos. Estou te vendo daqui.
- Joana, levanta. Agora.
- Mas, mas... Amor, o que houve?
- Levanta, Joana.
Joana se levanta.
- Isso, assim é melhor, você de frente pra mim e eu de frente pra você. Agora peço que não me interrompa.
- O que aconteceu, o que eu disse? Eu falei muito, né? Desculpa, eu não falo mais tanto assim, estou bancando a chata, eu sei, mas, amor...
- Joana, eu preciso falar e você não deixa eu falar. Por favor, fica quieta. Só um pouquinho. Vou ser breve. Só me escuta.
Sentindo seu coração começar a apertar, Joana acatou o pedido de seu namorado e se calou naquele instante.
- Eu estava procurando uma forma de dizer o que tenho pra dizer sem que te machucasse, mas acho que nenhum jeito vai evitar que você se machuque. Não estou feliz com o nosso relacionamento há algum tempo e tentei insistir nele mesmo assim, não te contei nada porque achei que fosse uma fase minha. Mas não é. Acho que nós dois temos caminhos diferentes. Você pra sul e eu pra norte, você pra leste e eu oeste. Não quero mais fingir que te amo e que sou feliz ao seu lado. Isso também me dói.
Com olhos de decepção, tomados por lágrimas prontas a se despejarem pelo seu belo rosto, Joana não hesitou.
- Quem agora não quer mais ouvir uma palavra tua sou eu. E digo mais, retiro tudo que eu disse sobre a sua boca. Ela acabou de me soltar tudo que um dia você disse nunca falar pra mim. Engula suas palavras amargas e a sua insatisfação. Dei a você todo o amor que eu podia dar a alguém.
Joana se levantou e em passos curtos, dominados por ódio, disse andando:
- Sua boca eu não beijo nunca mais.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Incapaz

Incapaz
Inibido de prazer
Ausente de poder
Vaidoso sem por quê
Ordinário sem querer
Ineficaz rapaz
Introspecto homem
De ideias boas enquanto
Repletas de emoção
Ineficaz intolerante
Desprovido de sabedoria
Escravo de sua mente impetuosa
Seja noite, ou seja dia

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Depois da meia noite

Após um dia estressante, nada melhor que uma cerveja gelada, sozinho ou acompanhado.E foi o que eu fiz.
Duas horinhas respirando um ar diferente do escritório, vendo a hora passar e pessoas diversas. Sozinho.
- Amigão, fecha a minha conta?
- Mais uma gelada?
Sorrindo fiz sinal negativo balançando a cabeça: - Amanhã o trabalho continua, a outra gelada fica pra outro dia.
- Tá certo. Débito ou crédito?
Devolvi o cartão para a minha carteira.
- Não, parceiro, dinheiro mesmo. Vai sobrar sete reais, né? É seu. Atendimento maravilhoso. - Disse batendo em suas costas.
O garçom me agradeceu com um belo sorriso e apertou forte a minha mão.
Podia ver a felicidade estampada em seu rosto.
Felicidade essa que me faltava.
O boteco ficava a duas quadras da minha casa. Fui embora andando.
Noite fresca, mas o paletó continuava seguro entre meus dedos e disposto nas minhas costas. Não via a hora de tirar aquela gravata.
Abri a porta e fui direto para o banho. Ao tirar o relógio do pulso vi que ele marcava 23 horas.
Terminei o banho e deitei;
Todos os dias eu dormia depois da meia noite. Era esse horário ela vinha de encontro a mim, que eu a sentia presente e que eu podia tentar tocá-la.
Depois da meia noite eu podia vê-la, sempre linda com os braços abertos vindo em minha direção.
Por mais triste que eu pudesse estar, ela sempre me acalmava. Por mais cansado que estivesse, ela me arrancava um sorriso que me deixava disposto outra vez.
Depois da meia noite eu resgatava forças. O meu grande amor me dizia para não desistir.
Depois da meia noite a filha que há dois anos eu havia perdido, aparecia  na frente dos meus olhos com um vestido rosa e dizia "Papai, eu te amo. Papai, eu sempre vou estar com você, não desiste de nada, não se canse da vida. Papai, eu te amo muito."
Sozinho em meu apartamento, eu chorava de soluçar.
Sozinho porque a mãe da minha filha também tinha me deixado. Mas não partiu pra outro mundo, partiu com outro cara para algum lugar do qual eu não faço ideia. E não, não quero nem saber.
Eu ainda tinha o meu grande amor.
Eu ainda tinha motivos pra viver e superar uma dor que me parecia sempre insuperável.
Porque eu sabia, que todos os dias depois da meia noite o meu sentido de viver se renovava e um novo e lindo dia chegaria.