quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Desapego

Eram 2 horas da manhã. Vagando pela cidade deserta, me sentia um fantasma perdido, sem direção, sem alma, sem qualquer rumo.
Diante do deserto, uma surpresa: um único bar aberto, com umas 5 pessoas dentro.
Não precisei pensar muito. Pra lá que eu fui.
Chegando, notei que o nível de animação não era o dos melhores e mais contagiantes.
Não sei se qualquer outra pessoa que se encontrasse na minha situação, permaneceria naquele ambiente, que no minimo levaria a divagações, pensamentos distantes ou até mesmo, quem sabe, conclusivos.
Ali, qualquer coisa de ruim que estivesse sendo sentida, seria exposta. Mas... o que esperar encontrar em um bar aberto 2 horas da manhã com 5 pessoas?
Sentei. Sentei distante de todos. De onde estava podia ver a rua, um pouco do céu, cada ser que lá estava e o balcão repleto de bebidas.
Estiquei o braço bruscamente acenando para o garçom que estava perto.
Pedi um conhaque, puro.
Ao pedir, peguei o garçom de surpresa. Ele ficou alguns segundos olhando meu rosto, diria até que estava esperando que eu dissesse: - "Desculpe, falei conhaque, puro?! Foi engano."
Sou uma mulher, sou sensível de natureza e conhaque está fora de cogitação: - "Traz um chazinho mesmo!"
Mal sabia ele que se eu pensasse em pedir um chazinho, no mínimo seria um bem psicodélico para me levar pra bem distante dali.
Olha, não sou nenhuma usuária de psicodélicos nem nada do tipo, mas naquele momento não me faria muito mal.
Por fim ele trouxe meu "afoga mágoas."
Mágoas, que mágoas? Eu falei mágoas?
Não sei o que se passa aqui dentro de mim. É um misto, algo como uma salada de decepção, frustração, dor, agonia, nostalgia.
Não sei. Virei aquele copo, mas foi tão subtamente que os 5 homens sentiram uma ponta de inveja do meu poder boêmio.
Bati o copo na mesa, acenei para o garçom mais uma vez.
Pedi um whisky. Precisava diferenciar. Qual é a graça de viver na igualdade, de beijar as mesmas bocas,  sofrer pelas mesmas coisas e pessoas, e beber a mesma bebida a noite toda?
Virei o whisky também e decidi fumar um cigarro. Pedi outra dose de whisky e acendi meu cigarro. Meu erro foi esse, ter acendido o bendito cigarro. Calmamente comecei a pensar nas coisas, pensei na tal igualdade, nos tais beijos, nas mesmas pessoas, e ai começou: beijo... pessoa, beijo... pessoa... ê saco!
Um relacionamento mal terminado, uma história complicada, desavenças, desencontros, enganos, infidelidade e eu disperdiçando todo amor que eu podia dar para alguém...
Minha cabeça começou a girar, fui tomada por uma coisa muito estranha.

- Garçom, uma dose dupla de desapego, com gelo por favor.
Todos no bar me olharam, o que não é grande coisa, porque todos, neste caso, eram 5 homens bêbados e obcecados por algum fantasma da vida.
 - Garçom, uma dose dupla de desapego, com gelo por favor! - E nada.
Será que esse maldito infeliz não está me ouvindo? Será que eu grito? Jogo meu cigarro pra cima? Tiro a roupa?
 - Garçom, uma dose...
- Acho melhor a senhora se retirar. Não está falando coisa com coisa, não aparenta estar bem. Não vou mais te servir por ordens do meu patrão.
- Quem você e o seu patrão pensa que são? Chame outro garçom, eu tenho dinheiro. Melhor, chame o seu patrão. Não saio daqui.
Como eu poderia imaginar que o patrão era simplesmente o diabo em pessoa?
O satanás que me perseguia há tanto tempo, em pensamento e sonho.
Ali estava ele, vivo, super presente na minha frente. O infeliz causador de tanto descontentamento e infelicidade.
Aquele que acabou com a minha vida. Aquele que jogou ao vento tudo que eu tinha pra dar a alguém.
Não dei chances. Deixei o dinheiro na mesa e saí pela porta com meu copo na mão.
Ele estava vazio.
Percebi então, naquele momento, que de fato não bebi conhaque ou whisky.
Bebi desapego. E por ter bebido, tive coragem o suficiente para ter abandonado quem tanto me machucou.
Atirei o copo na calçada. E continuei andando.

Nenhum comentário:

Postar um comentário